domingo, 24 de outubro de 2010

Esperança é o catso!

Essa coisa de escrever em prosa corrida e arfante tem horas que cansa, sabe? Ainda mais num dia como hoje, que chove lá fora e aqui dentro faz sol. Sabe fazer sol por dentro? Ter muita vontade de viver, muito lugar pra visitar, muita conversa pra jogar fora? Sim, porque não só os papéis e as lembranças que se enchem de poeira e precisam ser jogados fora. As conversas também. Vai dizer que você nunca ficou um tempão querendo dizer uma coisa pra alguém e por timidez, medo ou pura preguiça ficou quieto, na sua, como quem tá distraído vendo uma manada de elefantes passar pela janela? Pois então, quando isso acontece, só nos resta aguentar o tranco, porque palavra não dita é que nem jujuba no fundo do pote: depois de um tempo, vira gosma, gosma açucarada, que não serve nem praqueles momentos de abstinência. E te digo mais: não é só da abstinência de açúcar que falo não, me refiro a todas as abstinências do mundo, afinal, abstinência é abstinência em qualquer canto. Fartura é diferente. Quero ver o ser humano estar ali no maior bem bom e ficar pensando em regular a mixaria. Claro que estamos aqui falando de pessoas como nós, perdulárias, hedonistas e pusilânimes. Os outros, não sei como fazem, até mesmo porque isso é com eles, não posso ser analista de todas as alteridades do mundo, não é mesmo? Mas o que queria te dizer é que tô cansada de prosa. Queria poesia, uma coisa existirmos a que será que se destina pois quando turva-se a lágrima nordestina vi que és um homem lindo e que se acaso a sina do menino infeliz não se nos ilumina. Tudo bem, peguei pesado, parti logo pra Caetano. Mas tanto faria se tivesse ido pras bandas de Zeca Baleiro, que pra mim é tão ou mais poeta que Caetano. Vai dizer que quando você vira lousa pra que eu possa ser giz, quando você faz a minha carne triste quase feliz não é uma coisa de louco, de matar um de melancolia aguda? Aliás, já reparou que a melancolia de hoje não é mais como a de antigamente? Raciocina comigo: houve um tempo em que o passado era de fato passado, em que as pessoas davam aquela sofridinha básica por uma coisa ou outra, só pra ter o que fazer, só pra preencher de sentido os domingos chuvosos, ou os sábados de lua cheia. Hoje em dia é proibido. Quando você fica chateado por alguma coisa, logo te perguntam: quando foi isso? Se você diz que faz mais de uma semana, logo tem alguém pra te mandar deixar disso, pra não arrastar corrente, que o que passou, passou e coisa e tal. Ou seja, dez dias é o intervalo de tempo máximo que a contemporaneidade te permite refletir sobre um assunto que te incomodou antes dele virar obsoleto. Vai vendo, chegamos à era da digestão rápida de questões, da análise fast food e da alegria a qualquer custo. Pra mim, é tudo culpa do Prozac. E do Viagra. Se esses dois não existissem, as pessoas pensariam um pouco mais e não saíam por aí achando que tá tudo certo e que a esperança é a última que morre. Agora me diga, Astor: de que vale ser a última a morrer? Grandes merdas. Caguei pra esperança. Pra mim, ela é uma invenção burguesa, que nem o anti-aging, o colgate Total 12 e os cremes pra tonificar bundas. Quer saber? Das minhas rugas, cáries e celulites, cuido eu. São todas minhas conquistas. Agora chega, meu querido, vou tomar umas cachaças, que eu tô amarga demais pra beber cerveja.

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